REGINA DUARTE ENTREGA TROFÉU MÁRIO LAGO AO CANTOR ROBERTO CARLOS, DURANTE O PROGRAMA DOMINGÃO DO FAUSTÃO, DA REDE GLOBO, EM 30 DE DEZEMBRO DE 2012.
Por Alexandre Figueiredo
A intelectualidade pós-moderna, que se tornou a intelectualidade pró-brega pela ênfase que dava à defesa dos fenômenos popularescos, de vez em quando errou feio quando tentou apreciar a "cultura de massa" e esbarrou em personalidades claramente conservadoras que arranhariam a reputação das elites intelectuais, se elas mantivessem o apoio.
Era o começo dos anos 1990 e a telenovela e a música de Roberto Carlos, dentro de uma década que, no exterior, gourmetizava o hit-parade estrangeiro - como as rádios de pop adulto, que promoviam a falsa bandeira da "música sofisticada", mas tocavam até o mais rasteiro pop romântico - , eram pautas de teses acadêmicas que mostravam sua importância e contribuição para a cultura brasileira.
Em princípio, eram iniciativas válidas, que promoviam o debate cultural em torno da "cultura de massa", e faziam com que as pessoas observassem o contexto histórico e sociológico daquilo que atingia o grande público.
Isso em si não é ruim. Mas, com o tempo, criou-se uma linhagem de intelectuais - adestrada pelo "padrão USP-PSDB" de pensar a cultura, com base nas ideias de Fernando Henrique Cardoso para a Teoria da Dependência, criou-se uma tendência, que depois se tornou crescente, de defender os fenômenos popularescos, com um empenho comparável ao do antigo complexo IPES-IBAD em relação às ideias neoliberais, nos anos 1960.
A postura dos intelectuais que se ascenderam defendendo a "cultura de massa", através de um discurso que definia os fenômenos popularescos - artificialmente moldados pelo poder midiático e mercadológico associados - como "cultura verdadeiramente popular", criou um sério problema ao banir o senso crítico dos cursos de pós-graduação, que na prática passaram a ser meros propagandistas do "estabelecido", desproblematizando as "problemáticas" estudadas.
Trata-se de uma geração de intelectuais que, se apropriando de uma retórica pós-tropicalista - que já havia dissolvido o teor crítico da antiga Tropicália de 1967-1969 - , desenvolveu seu discurso somando às alegações pós-tropicalistas e pós-modernistas uma mal-disfarçada retórica neoliberal, mascarada por uma mitificação supostamente messiânica da imagem espetacularizada das classes populares, já desenvolvida pelo processo midiático dominante.
Tentando passar uma imagem "progressista" de suas pregações, através de uma ideia simplória de que o entretenimento popularesco, na medida em que é supostamente associada à "cultura das periferias" - com supostas atribuições de "rebelião e libertação" - , a intelectualidade pró-brega tentava manter as aparências, com seu suposto apoio aos governos Lula e Dilma Rousseff, com vistas a conquistar financiamentos previstos pela Lei Rouanet.
Mas há momentos em que essa intelectualidade derrapa, e aí vemos o caso de Roberto Carlos e, de maneira indireta, Regina Duarte, não por ela ter recebido apoio pessoal dessas elites intelectuais, mas por ela ter sido um dos símbolos maiores da história das telenovelas brasileiras.
FIGURAS CONSERVADORAS
Roberto Carlos foi adotado pela comunidade acadêmica através do exemplo paulista, que, a partir dos anos 1980 e, de forma ainda mais sistemática, dos anos 1990, acolheu a Jovem Guarda como uma importante fenomenologia da cultura jovem brasileira.
A Jovem Guarda e, em particular, Roberto Carlos, passou a ser considerada um fenômeno que teve contribuição fundamental para a modernização da música brasileira, através da forte influência exercida pela Tropicália, que deve aos jovem-guardistas a introdução das novidades da cultura estrangeira no Brasil, no caso o rock.
Através dessa abordagem, Roberto Carlos tornou-se praticamente um "emepebista perdido entre acordes de guitarra", e a reabilitação do cantor capixaba, que naquela época não vivia uma fase musical inspirada, marcada por canções piegas que nem de longe lembravam o promissor cantor e apresentador do programa Jovem Guarda (TV Record - São Paulo), permitiu vislumbrar a fase de ascensão e auge do "Rei".
Mesmo sendo conservador, Roberto Carlos fascinava setores progressistas, autênticos e bastardos, da intelectualidade pós-moderna brasileira, pelo carisma da Jovem Guarda e pela fase romântica de 1968-1977 marcada por um não reconhecido talento soul, onde até mesmo a canção "Jesus Cristo", em sua gravação original de 1969, tinha um arranjo considerado "arrasa-quarteirões".
Todavia, as posturas de Roberto Carlos contra biografias não-autorizadas, ordenando a retirada do mercado do livro Roberto Carlos em Detalhes, de Paulo César de Araújo - que afirma ter procurado o cantor para dar entrevistas, mas nunca teve o pedido atendido - , causou decepção nos meios intelectuais, que passaram a defender uma "Jovem Guarda sem Roberto Carlos", escolhendo o cantor brega Odair José, ídolo tardio da JG, como substituto.
Com o episódio e com a reafirmação da postura contrária às biografias não-autorizadas de Roberto Carlos, a mídia resgatou episódios de posturas conservadoras do cantor capixaba, como a antiga defesa da ditadura militar, manifesta no começo dos anos 1970, que condizem, também, a um episódio recente, quando o "Rei" recebeu calorosamente o ministro da Justiça do governo Jair Bolsoanro, o ex-juiz Sérgio Moro, a ponto de o cantor mudar seu bordão, "É uma brasa, mora!", para "É uma brasa, Moro!".
Falando em Jair Bolsonaro, o apoio da atriz Regina Duarte, que desde 1965 era conhecida como "a namoradinha do Brasil", ao político extremo-direitista que hoje preside a República, derrubou a reputação da atriz que havia sido considerada a "Audrey Hepburn brasileira" e se consagrou pela minissérie de conteúdo feminista, Malu Mulher, da Rede Globo de Televisão.
Desde que se manifestou "com medo de ver Lula presidindo o Brasil" - posição compartilhada por um famoso "médium espírita", falecido em 2002, erroneamente visto como "progressista" pelas práticas meramente assistencialistas que foram superestimadas - , a atriz fez acender o sinal amarelo para os progressistas autênticos e bastardos que ainda mantinham na memória a imagem divertida da Viúva Porcina da novela Roque Santeiro.
Desempenhando de maneira agressiva na campanha contra Dilma Rousseff, a atriz Regina Duarte se consagrou como uma das vozes do conservadorismo ideológico brasileiro, condizente com as atividades de pecuarista, que renderam um breve casamento com um fazendeiro. Discursando junto com o Movimento Brasil Livre, Regina ganhou fama com suas posturas reacionárias, que culminaram com o apoio dela aos governos Michel Temer e Jair Bolsonaro.
Recentemente, Regina tornou-se notícia através do "noivado" com Jair Bolsonaro, metáfora para o convite que o presidente lhe fez para substituir o secretário especial de Cultura, Roberto Alvim, que deixou o cargo após vazar uma postura nazista - que condiz ao governo Bolsonaro, mas este não quer que esta postura seja exposta ao público, pois seu governo se autoproclama "democrático" - , quando, num discurso promovendo uma "nova cultura", se inspirou claramente no publicitário alemão Josef Goëbbels, ministro de Adolf Hitler.
Até o momento, Regina Duarte não assumiu a pasta da Secretaria Especial de Cultura - que, sabemos, foi o que restou do antigo Ministério da Cultura - , mas ela, até prova em contrário, sinaliza interesse em exercer o cargo, já propondo, entre outras coisas, a criação de "bailes de família" para concorrer com os "bailes funk", uma bobagem moralista que só favorece a mediocridade cultural dos funqueiros.
Com tais episódios, Roberto Carlos e Regina Duarte mostram o risco que se tem de acolher a "cultura de massa" de maneira ampla e irrestrita, expondo os constantes aspectos conservadores nela existentes e que não se limitam ao cantor e à atriz, envolvendo até mesmo os ídolos popularescos, tão associados a uma suposta rebelião libertária.
FONTES: Brasil 247, Diário do Centro do Mundo, Blogue Linhaça Atômica, Blogue Mingau de Aço.
Por Alexandre Figueiredo
A intelectualidade pós-moderna, que se tornou a intelectualidade pró-brega pela ênfase que dava à defesa dos fenômenos popularescos, de vez em quando errou feio quando tentou apreciar a "cultura de massa" e esbarrou em personalidades claramente conservadoras que arranhariam a reputação das elites intelectuais, se elas mantivessem o apoio.
Era o começo dos anos 1990 e a telenovela e a música de Roberto Carlos, dentro de uma década que, no exterior, gourmetizava o hit-parade estrangeiro - como as rádios de pop adulto, que promoviam a falsa bandeira da "música sofisticada", mas tocavam até o mais rasteiro pop romântico - , eram pautas de teses acadêmicas que mostravam sua importância e contribuição para a cultura brasileira.
Em princípio, eram iniciativas válidas, que promoviam o debate cultural em torno da "cultura de massa", e faziam com que as pessoas observassem o contexto histórico e sociológico daquilo que atingia o grande público.
Isso em si não é ruim. Mas, com o tempo, criou-se uma linhagem de intelectuais - adestrada pelo "padrão USP-PSDB" de pensar a cultura, com base nas ideias de Fernando Henrique Cardoso para a Teoria da Dependência, criou-se uma tendência, que depois se tornou crescente, de defender os fenômenos popularescos, com um empenho comparável ao do antigo complexo IPES-IBAD em relação às ideias neoliberais, nos anos 1960.
A postura dos intelectuais que se ascenderam defendendo a "cultura de massa", através de um discurso que definia os fenômenos popularescos - artificialmente moldados pelo poder midiático e mercadológico associados - como "cultura verdadeiramente popular", criou um sério problema ao banir o senso crítico dos cursos de pós-graduação, que na prática passaram a ser meros propagandistas do "estabelecido", desproblematizando as "problemáticas" estudadas.
Trata-se de uma geração de intelectuais que, se apropriando de uma retórica pós-tropicalista - que já havia dissolvido o teor crítico da antiga Tropicália de 1967-1969 - , desenvolveu seu discurso somando às alegações pós-tropicalistas e pós-modernistas uma mal-disfarçada retórica neoliberal, mascarada por uma mitificação supostamente messiânica da imagem espetacularizada das classes populares, já desenvolvida pelo processo midiático dominante.
Tentando passar uma imagem "progressista" de suas pregações, através de uma ideia simplória de que o entretenimento popularesco, na medida em que é supostamente associada à "cultura das periferias" - com supostas atribuições de "rebelião e libertação" - , a intelectualidade pró-brega tentava manter as aparências, com seu suposto apoio aos governos Lula e Dilma Rousseff, com vistas a conquistar financiamentos previstos pela Lei Rouanet.
Mas há momentos em que essa intelectualidade derrapa, e aí vemos o caso de Roberto Carlos e, de maneira indireta, Regina Duarte, não por ela ter recebido apoio pessoal dessas elites intelectuais, mas por ela ter sido um dos símbolos maiores da história das telenovelas brasileiras.
FIGURAS CONSERVADORAS
Roberto Carlos foi adotado pela comunidade acadêmica através do exemplo paulista, que, a partir dos anos 1980 e, de forma ainda mais sistemática, dos anos 1990, acolheu a Jovem Guarda como uma importante fenomenologia da cultura jovem brasileira.
A Jovem Guarda e, em particular, Roberto Carlos, passou a ser considerada um fenômeno que teve contribuição fundamental para a modernização da música brasileira, através da forte influência exercida pela Tropicália, que deve aos jovem-guardistas a introdução das novidades da cultura estrangeira no Brasil, no caso o rock.
Através dessa abordagem, Roberto Carlos tornou-se praticamente um "emepebista perdido entre acordes de guitarra", e a reabilitação do cantor capixaba, que naquela época não vivia uma fase musical inspirada, marcada por canções piegas que nem de longe lembravam o promissor cantor e apresentador do programa Jovem Guarda (TV Record - São Paulo), permitiu vislumbrar a fase de ascensão e auge do "Rei".
Mesmo sendo conservador, Roberto Carlos fascinava setores progressistas, autênticos e bastardos, da intelectualidade pós-moderna brasileira, pelo carisma da Jovem Guarda e pela fase romântica de 1968-1977 marcada por um não reconhecido talento soul, onde até mesmo a canção "Jesus Cristo", em sua gravação original de 1969, tinha um arranjo considerado "arrasa-quarteirões".
Todavia, as posturas de Roberto Carlos contra biografias não-autorizadas, ordenando a retirada do mercado do livro Roberto Carlos em Detalhes, de Paulo César de Araújo - que afirma ter procurado o cantor para dar entrevistas, mas nunca teve o pedido atendido - , causou decepção nos meios intelectuais, que passaram a defender uma "Jovem Guarda sem Roberto Carlos", escolhendo o cantor brega Odair José, ídolo tardio da JG, como substituto.
Com o episódio e com a reafirmação da postura contrária às biografias não-autorizadas de Roberto Carlos, a mídia resgatou episódios de posturas conservadoras do cantor capixaba, como a antiga defesa da ditadura militar, manifesta no começo dos anos 1970, que condizem, também, a um episódio recente, quando o "Rei" recebeu calorosamente o ministro da Justiça do governo Jair Bolsoanro, o ex-juiz Sérgio Moro, a ponto de o cantor mudar seu bordão, "É uma brasa, mora!", para "É uma brasa, Moro!".
Falando em Jair Bolsonaro, o apoio da atriz Regina Duarte, que desde 1965 era conhecida como "a namoradinha do Brasil", ao político extremo-direitista que hoje preside a República, derrubou a reputação da atriz que havia sido considerada a "Audrey Hepburn brasileira" e se consagrou pela minissérie de conteúdo feminista, Malu Mulher, da Rede Globo de Televisão.
Desde que se manifestou "com medo de ver Lula presidindo o Brasil" - posição compartilhada por um famoso "médium espírita", falecido em 2002, erroneamente visto como "progressista" pelas práticas meramente assistencialistas que foram superestimadas - , a atriz fez acender o sinal amarelo para os progressistas autênticos e bastardos que ainda mantinham na memória a imagem divertida da Viúva Porcina da novela Roque Santeiro.
Desempenhando de maneira agressiva na campanha contra Dilma Rousseff, a atriz Regina Duarte se consagrou como uma das vozes do conservadorismo ideológico brasileiro, condizente com as atividades de pecuarista, que renderam um breve casamento com um fazendeiro. Discursando junto com o Movimento Brasil Livre, Regina ganhou fama com suas posturas reacionárias, que culminaram com o apoio dela aos governos Michel Temer e Jair Bolsonaro.
Recentemente, Regina tornou-se notícia através do "noivado" com Jair Bolsonaro, metáfora para o convite que o presidente lhe fez para substituir o secretário especial de Cultura, Roberto Alvim, que deixou o cargo após vazar uma postura nazista - que condiz ao governo Bolsonaro, mas este não quer que esta postura seja exposta ao público, pois seu governo se autoproclama "democrático" - , quando, num discurso promovendo uma "nova cultura", se inspirou claramente no publicitário alemão Josef Goëbbels, ministro de Adolf Hitler.
Até o momento, Regina Duarte não assumiu a pasta da Secretaria Especial de Cultura - que, sabemos, foi o que restou do antigo Ministério da Cultura - , mas ela, até prova em contrário, sinaliza interesse em exercer o cargo, já propondo, entre outras coisas, a criação de "bailes de família" para concorrer com os "bailes funk", uma bobagem moralista que só favorece a mediocridade cultural dos funqueiros.
Com tais episódios, Roberto Carlos e Regina Duarte mostram o risco que se tem de acolher a "cultura de massa" de maneira ampla e irrestrita, expondo os constantes aspectos conservadores nela existentes e que não se limitam ao cantor e à atriz, envolvendo até mesmo os ídolos popularescos, tão associados a uma suposta rebelião libertária.
FONTES: Brasil 247, Diário do Centro do Mundo, Blogue Linhaça Atômica, Blogue Mingau de Aço.
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