A SECRETÁRIA ESPECIAL DE CULTURA E ATRIZ, REGINA DUARTE, COM JAIR BOLSONARO E, ÚLTIMO À DIREITA, O MINISTRO DO TURISMO MARCELO ÁLVARO ANTÔNIO.
Por Alexandre Figueiredo
A atuação técnica do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), apesar dos incidentes problemáticos, como o caso da construção do edifício La Vue, em Salvador, e o incêndio no Museu Nacional, no Rio de Janeiro, manteve, em níveis minimamente impecáveis, um desempenho em nível técnico, mesmo depois do golpe político de 2016.
Neste caso, a atuação de Kátia Bogéa manteve a instituição num bom termo, apesar de sua situação delicada, com a ameaça de extinção do Ministério da Cultura, pelo governo Michel Temer, que se concretizou mas foi revertida, e com sua extinção definitiva por Jair Bolsonaro, que substituiu o antigo ministério por uma "secretaria especial". Kátia foi nomeada em 2016 e exonerada no final de 2019, com o IPHAN entregue a presidentes interinos.
Atualmente, a Secretaria Especial de Cultura está sob a tutela do Ministério do Turismo, e a escolha da nova presidente do IPHAN, Larissa Rodrigues Peixoto Dutra, tem esse interesse estratégico. A nomeação deixou parte dos servidores do instituto em clima de apreensão, porque a orientação passará a priorizar os interesses comerciais turísticos, em detrimento do interesse público relacionado com o patrimônio histórico e artístico-cultural.
Larissa Peixoto Dutra é formada em Hotelaria e tem carreira no Ministério do Turismo, com cargo exercido no Departamento de Desenvolvimento Produtivo. Ela também foi chefe do Gabinete da Secretaria Nacional de Desenvolvimento de Competitividade do Turismo, no Ministério do Turismo, e comandou o Gabinete da Secretaria Nacional de Qualificação e Promoção do Turismo.
Ela emitiu um comunicado, prometendo, ao assumir o IPHAN, "estabelecer parcerias que auxiliem na consolidação do patrimônio cultural brasileiro como vetor de desenvolvimento para as cidades, contribuindo especialmente nesse momento de retomada da economia". O compromisso segue a mesma lógica do projeto Revive Brasil, programa destinado a revitalizar o patrimônio público com ênfase nas atividades econômicas.
Isso indica que a atividade de Larissa Peixoto Dutra irá dialogar com o projeto neoliberal de Bolsonaro, que defende o fim do isolamento social contra a Covid-19 sob o pretexto de que "o Brasil não pode parar e deve movimentar a economia".
Segundo vários funcionários do IPHAN, o conflito de interesses da instituição e da virtual futura presidente, cuja nomeação poderá ser contestada pelo Ministério Público Federal, por intermédio da Procuradoria Geral dos Direitos do Cidadão, se deve ao fato de que a prioridade da sua gestão será aproveitar o patrimônio histórico material e imaterial para fins de exploração meramente turística, colocando o caráter financeiro e de consumo acima das finalidades sociais que estavam inerentes aos bens patrimoniais.
Há, também, da parte dos mesmos servidores, a acusação de que Larissa não tem competência para presidir o IPHAN. De acordo com o ex-diretor de Patrimônio Material e Fiscalização do IPHAN, Andrey Rosenthal Schlee, Larissa não tem qualificação para o cargo. "Não se trata de corporativismo. Respeito os profissionais do turismo e da hotelaria. Não é também pela questão de ser ou não arquiteto. É sobre a total falta de experiência na área", afirmou o ex-diretor, também arquiteto.
Andrey, que desempenhou a referida função que, um dia, já teve o também arquiteto Lúcio Costa, um dos idealizadores de Brasília, como titular, afirma que "governo quer acabar com a instituição que é responsável pela memória do país".
Esta visão vai além do pragmatismo do brasileiro médio, que não tem ideia da diferença entre função social e interesses econômicos. Durante a fase intensa do "combate ao preconceito", a campanha pela bregalização do país, a falta de discernimento entre a música brasileira comercial - a música popularesca - e a não-comercial - a MPB e o Rock Brasil - remete a uma confusão de interpretações, como supor que o comercialismo não é uma finalidade dos popularescos, que veem o dinheiro como "apenas um meio de viabilização econômica".
A confusão de uma criação cultural, para fins sociais, mas remunerada para viabilizar a sobrevivência do criador cultural não deve ser confundida com os interesses comerciais de ídolos popularescos, estes vendo o dinheiro como um fim e se moldando através das demandas do público consumidor, cometendo um ato de profunda desonestidade artística.
A nomeação de Larissa Rodrigues não agradou sequer o ex-ministro da Cultura do governo Michel Temer, Marcelo Calero, que durante o exercício do cargo tornou-se famoso por denunciar as pressões do então ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, que vê na escolha de Larissa um erro, por ela não ter experiência compatível com as necessidades do IPHAN.
"Nada de pessoal contra ela, mas precisamos que esteja no Iphan alguém com as qualificações necessárias para tanto. É inacreditável que um governo que tenha sido eleito prometendo preencher os cargos de confiança com pessoal técnico se preste a esse papel", disse Calero.
Hoje deputado pelo Cidadania fluminense, Calero propôs um projeto de criação de decreto legislativo para barrar nomeações como as de Larissa, e o ex-ministro, que é também advogado, está estudando meios legais e argumentos jurídicos para justificar a incompatibilidade dela para o cargo. É uma iniciativa que complementa a apreciação do MPF em relação à mesma nomeação.
FONTES: Folha de São Paulo, Veja.
Por Alexandre Figueiredo
A atuação técnica do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), apesar dos incidentes problemáticos, como o caso da construção do edifício La Vue, em Salvador, e o incêndio no Museu Nacional, no Rio de Janeiro, manteve, em níveis minimamente impecáveis, um desempenho em nível técnico, mesmo depois do golpe político de 2016.
Neste caso, a atuação de Kátia Bogéa manteve a instituição num bom termo, apesar de sua situação delicada, com a ameaça de extinção do Ministério da Cultura, pelo governo Michel Temer, que se concretizou mas foi revertida, e com sua extinção definitiva por Jair Bolsonaro, que substituiu o antigo ministério por uma "secretaria especial". Kátia foi nomeada em 2016 e exonerada no final de 2019, com o IPHAN entregue a presidentes interinos.
Atualmente, a Secretaria Especial de Cultura está sob a tutela do Ministério do Turismo, e a escolha da nova presidente do IPHAN, Larissa Rodrigues Peixoto Dutra, tem esse interesse estratégico. A nomeação deixou parte dos servidores do instituto em clima de apreensão, porque a orientação passará a priorizar os interesses comerciais turísticos, em detrimento do interesse público relacionado com o patrimônio histórico e artístico-cultural.
Larissa Peixoto Dutra é formada em Hotelaria e tem carreira no Ministério do Turismo, com cargo exercido no Departamento de Desenvolvimento Produtivo. Ela também foi chefe do Gabinete da Secretaria Nacional de Desenvolvimento de Competitividade do Turismo, no Ministério do Turismo, e comandou o Gabinete da Secretaria Nacional de Qualificação e Promoção do Turismo.
Ela emitiu um comunicado, prometendo, ao assumir o IPHAN, "estabelecer parcerias que auxiliem na consolidação do patrimônio cultural brasileiro como vetor de desenvolvimento para as cidades, contribuindo especialmente nesse momento de retomada da economia". O compromisso segue a mesma lógica do projeto Revive Brasil, programa destinado a revitalizar o patrimônio público com ênfase nas atividades econômicas.
Isso indica que a atividade de Larissa Peixoto Dutra irá dialogar com o projeto neoliberal de Bolsonaro, que defende o fim do isolamento social contra a Covid-19 sob o pretexto de que "o Brasil não pode parar e deve movimentar a economia".
Segundo vários funcionários do IPHAN, o conflito de interesses da instituição e da virtual futura presidente, cuja nomeação poderá ser contestada pelo Ministério Público Federal, por intermédio da Procuradoria Geral dos Direitos do Cidadão, se deve ao fato de que a prioridade da sua gestão será aproveitar o patrimônio histórico material e imaterial para fins de exploração meramente turística, colocando o caráter financeiro e de consumo acima das finalidades sociais que estavam inerentes aos bens patrimoniais.
Há, também, da parte dos mesmos servidores, a acusação de que Larissa não tem competência para presidir o IPHAN. De acordo com o ex-diretor de Patrimônio Material e Fiscalização do IPHAN, Andrey Rosenthal Schlee, Larissa não tem qualificação para o cargo. "Não se trata de corporativismo. Respeito os profissionais do turismo e da hotelaria. Não é também pela questão de ser ou não arquiteto. É sobre a total falta de experiência na área", afirmou o ex-diretor, também arquiteto.
Andrey, que desempenhou a referida função que, um dia, já teve o também arquiteto Lúcio Costa, um dos idealizadores de Brasília, como titular, afirma que "governo quer acabar com a instituição que é responsável pela memória do país".
Esta visão vai além do pragmatismo do brasileiro médio, que não tem ideia da diferença entre função social e interesses econômicos. Durante a fase intensa do "combate ao preconceito", a campanha pela bregalização do país, a falta de discernimento entre a música brasileira comercial - a música popularesca - e a não-comercial - a MPB e o Rock Brasil - remete a uma confusão de interpretações, como supor que o comercialismo não é uma finalidade dos popularescos, que veem o dinheiro como "apenas um meio de viabilização econômica".
A confusão de uma criação cultural, para fins sociais, mas remunerada para viabilizar a sobrevivência do criador cultural não deve ser confundida com os interesses comerciais de ídolos popularescos, estes vendo o dinheiro como um fim e se moldando através das demandas do público consumidor, cometendo um ato de profunda desonestidade artística.
A nomeação de Larissa Rodrigues não agradou sequer o ex-ministro da Cultura do governo Michel Temer, Marcelo Calero, que durante o exercício do cargo tornou-se famoso por denunciar as pressões do então ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, que vê na escolha de Larissa um erro, por ela não ter experiência compatível com as necessidades do IPHAN.
"Nada de pessoal contra ela, mas precisamos que esteja no Iphan alguém com as qualificações necessárias para tanto. É inacreditável que um governo que tenha sido eleito prometendo preencher os cargos de confiança com pessoal técnico se preste a esse papel", disse Calero.
Hoje deputado pelo Cidadania fluminense, Calero propôs um projeto de criação de decreto legislativo para barrar nomeações como as de Larissa, e o ex-ministro, que é também advogado, está estudando meios legais e argumentos jurídicos para justificar a incompatibilidade dela para o cargo. É uma iniciativa que complementa a apreciação do MPF em relação à mesma nomeação.
FONTES: Folha de São Paulo, Veja.
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