Por Alexandre Figueiredo
O risco das atividades do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) perder a relevância técnica, que era mantida até mesmo durante o governo conservador de Michel Temer, está se tornando mais evidente durante o governo Jair Bolsonaro.
Segundo divulgado na reunião ministerial de 22 de abril de 2020, divulgada um mês depois por decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello, o presidente Jair Bolsonaro queria exercer controle no IPHAN, interesse que, depois, descobriu-se ter sido influenciado pelas pressões do filho e senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e pelo empresário catarinense Luciano Hang.
Flávio Bolsonaro, quando esteve em Salvador, ouviu empresários da construção civil locais reclamando das restrições dadas pela 7ª Superintendência Regional do IPHAN (que envolve Bahia e Sergipe) para as obras e construções no entorno da Barra, bairro nobre da capital baiana, mas dotada também de prédios históricos.
No mesmo bairro, ocorreu o problema da construção do Edifício La Vue Salvador, de interesse do então ministro da Secretaria de Governo, Michel Temer, que o IPHAN local autorizou, embora o novo edifício viesse não só a causar um contraste visual com os edifícios antigos do bairro, como também iria se sobrepôr à paisagem local, desvalorizando as construções históricas.
Luciano Hang, conhecido como o "véio da Havan" e um dos maiores propagandistas do governo Jair Bolsonaro, reclamou de uma paralisação das obras da filial das Lojas Havan - fundada em Brusque, interior de Santa Catarina, a empresa está em processo de expansão favorecida por incentivos financeiros e fiscais do presidente e amigo de Hang - , por causa de fósseis e objetos históricos encontrados no lugar.
"O IPHAN para qualquer obra do Brasil, como para a do Luciano Hang. Enquanto tá lá um cocô petrificado de índio, para a obra, pô! Para a obra. O que que tem que fazer? Alguém do IPHAN que resolva o assunto, né? É assim que nós temos que proceder", disse Jair Bolsonaro, reclamando da paralisação ordenada em 2019.
Por sua vez, Hang escreveu, com ironia, no seu perfil no Twitter: "Queremos inaugurar a loja em novembro, mas como os burocratas no Brasil não têm pressa, me pergunto: quando teremos uma resposta do IPHAN? Eu não sei se é louça portuguesa, se é louça lá da Oxford, de Santa Catarina, ou de alguém que morou aqui. Até, de repente, pode ser de um índio. Pode ser".
Em entrevista ao Painel, na Folha de São Paulo, a ex-presidente do IPHAN, a historiadora Kátia Bogéa reclama das promessas de que Jair Bolsonaro iria substitui-la, no comando da autarquia, por alguém com capacidade técnica para a função.
"E vem com esse discurso mentiroso de que teria que ter perfil técnico para ocupar cargos no governo. Tudo mentira! É triste ver o Iphan invadido por gente sem formação", reclamou Bogéa, que acrescentou que Bolsonaro mandou exonerar outros diretores e coordenadores de formação técnica, que foram substituídos por pessoas sem formação nos setores.
Sobre Luciano Hang, Bogéa declarou: "Ele criou esse escarcéu porque nem a mais simples das obrigações eles querem fazer. Estávamos ali para cumprir a Constituição. O que queriam é que não observássemos a lei".
Depois que Kátia Bogéa foi exonerada do comando do IPHAN, houve uma fase de presidentes interinos, até que Jair Bolsonaro decidiu indicar Larissa Rodrigues Peixoto Dutra para a presidência da instituição. A indicação ainda não foi consolidada, porque processos na Justiça deixaram a medida pendente, com o risco de Larissa não assumir o cargo.
Sem formação técnica, Larissa atende a interesses nepotistas de Bolsonaro, que se elegeu prometendo "combater a corrupção" e "governar o país com austeridade e honestidade". Ela é casada com Gerson Dutra Júnior, policial federal conhecido como Patropa, e que é um grande amigo de Leonardo de Jesus, o Léo Índio, primo dos filhos do presidente.
FONTES: Folha de São Paulo, Revista Fórum.
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