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PÓS-GRADUAÇÃO PAGA AGRAVARÁ GRANDES BARREIRAS PARA O CONHECIMENTO


Por Alexandre Figueiredo

Foi aprovada anteontem, na plenária da Câmara dos Deputados, a proposta que permite a cobrança de mensalidades em cursos de pós-graduação nas universidades públicas. A Proposta de Emenda Constitucional, cujo autor do texto original é o deputado Alex Canziani (PTB-PR) e com texto substitutivo do colega Cleber Verde (PRB-MA), ainda depende da votação no Senado para aprovação definitiva.

O projeto propõe que cursos universitários de pós-graduação lato sensu (especialização), assim como os de Mestrado profissional e extensão, cobrem taxas de mensalidades de seus alunos. Segundo seus defensores, a medida visa melhorar a arrecadação de recursos das instituições de ensino superior.

A proposta de pós-graduação paga, que contou com a oposição de partidos como PSOL, PC do B e o recém-criado REDE (Rede Sustentabilidade, de Marina Silva), embora o Partido dos Trabalhadores tenha deixado a questão facultativa (os petistas poderiam votar contra ou a favor, se quiserem), no entanto, pode agravar o quadro já restritivo do ensino superior de pós-graduação.

Ela corresponde a uma alteração do texto da Constituição Federal de 1988, que prevê, no artigo 206, inciso IV, sobre a gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais. O texto é descrito da seguinte forma, na Carta Magna:

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

Embora seja permitida a alteração de artigos como este, que não correspondem às chamadas "cláusulas pétreas" (às quais é proibida alteração por emenda constitucional) e se justifique a iniciativa pelos baixos recursos que atividades de pesquisa recebem do poder público, a PEC da pós-graduação paga pode ser um caminho para a privatização do ensino superior.

A PEC se baseia numa visão mercadológica do ensino superior, no qual se limita apenas a abordagem do aprendizado profissional. Todavia, nem sempre a mercantilização do ensino favorecerá a produção do conhecimento, porque este tem um leque muito maior do que o mero aprendizado de um trabalho profissional.

O conhecimento não envolve apenas aspectos técnicos ou o pensamento teórico científico. Ele envolve também práticas e finalidades sociais, para as quais a Educação mercantilizada deixa em segundo ou terceiro planos, e mesmo assim submetidas a demandas já expressas no mercado.

Dessa forma, por exemplo, se o ensino mercadológico considera assistir as comunidades populares, é mediante demandas institucionais que refletem interesses estratégicos em prol do turismo e da diminuição de impostos para empresas que realizam ou investem em projetos filantrópicos.

A PEC não é consenso no meio acadêmico, como lembrou a deputada baiana Alice Portugal, do PC do B. Ela citou a Associação Nacional Dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) que não formou posição sobre o assunto, e a Associação Nacional de Pós-graduandos (ANPG), contrária à proposta, como exemplo da falta de unanimidade da mesma.

"É uma proposta privatista que reduz a responsabilidade do Estado, intensifica a privatização e o modelo de universidade gerencial. O modelo de universidade com ensino pesquisa extensão é o melhor modelo de universidade se quisermos construir uma proposta de futuro para o país", disse o deputado paulista Ivan Valente, do PSOL.

REALIDADE JÁ RESTRITIVA

Os cursos de pós-graduação já vivem um pouco dessa realidade prevista na PEC. Vários cursos de mestrado profissional, como os chamados MBA (Master of Business Administration), já cobram taxas bastante caras para seus alunos, que procuram nessa área do ensino uma formação mais abrangente para o mercado de trabalho.

Curiosamente, o MBA não é legalmente reconhecido como "mestrado" apesar do nome, Mestrado de Administração de Negócios, e da alta reputação em vários setores do mercado. Segundo a lei, ele ainda é considerado um curso de especialização, ou seja, a pós-graduação lato-sensu, um dos setores abordados pela proposta de emenda para a Constituição.

Há também a restrição ideológica, que afeta até mesmo cursos gratuitos. A supremacia de uma mentalidade meramente descritivista e apologética dos cursos de pós-graduação não permite que pessoas com o nível de pensamento questionador, como o dos grandes intelectuais do exterior, tenha acesso ao Mestrado e ao Doutorado.

A abordagem da cultura popular brasileira é um exemplo disso. Trabalhos questionadores são praticamente proibidos. Existe até mesmo um padrão discursivo que transforma monografias em textos adornados de expressões e palavras cultas e formais, e de textos que apenas explicam demais os métodos de pesquisa e soam como mero desfile de fontes bibliográficas consultadas.

Os próprios aspirantes a intelectuais questionadores são discriminados já na entrada dos cursos de Mestrado e de Especialização, considerados os primeiros acessos para a pós-graduação educacional. A burocracia acadêmica discrimina o trabalho questionador de qualquer fenômeno como se fosse ato de "rebeldia juvenil" feita para "desestabilizar" a sociedade.

É uma visão preconceituosa que despreza o fato de que, até mesmo na Europa, o Estado patrocina projetos de pesquisa arriscados, que causam polêmicas sérias por desafiar totens estabelecidos e derrubar ídolos consagrados. Mesmo veteranos como Noam Chomsky e Umberto Eco são consagrados por lançar questionamentos nesse sentido, mesmo na velhice.

Aqui no Brasil, porém, o que prevalece é a suposta objetividade das monografias, cuja ilusão de imparcialidade torna as pesquisas inócuas e insípidas. Os pós-graduandos perdem muito tempo adornando um discurso vazio com divagações argumentativas vazias, extremamente formais, mas sem um conteúdo interessante para que suas teses fossem apreciadas.

A maioria do que se produz nos meios acadêmicos são teses que "morrem" depois das exposições finais na pós-graduação. São textos corretíssimos em discurso e metodologia, belos desfiles de citações de fontes pesquisadas, combinadas a um engenhoso texto de explicação da escolha da tese para pesquisa.

Mas são textos ocos, em muitos casos meramente descritivos e até apologistas ao problema pesquisado, sob a suposição de que sua "problemática" prevalece por apresentar uma "válida produção de sentido" para a sociedade, de uma maneira ou de outra.

Muitas dessas teses foram feitas para corroborar fenômenos de valor duvidoso, como o "funk carioca", um subproduto do mercado midiático travestido de "moderno folclore carioca", em que uma narrativa "etnográfica" não condiz à natureza real do gênero, conhecido pelos limites artísticos combinados a valores morais retrógrados, publicidade enganosa e mercado explorador de mão-de-obra desqualificada.

As monografias não permitem questionamentos, e o leitor médio que possa ter acesso a essas teses se cansa quando, em mais de cem páginas, o autor ainda tenta explicar o propósito de seu trabalho, a metodologia adotada e os "confrontos" maçantes de autores relacionados ao assunto.

Se isso já ocorre em cursos gratuitos de pós-graduação, em que a barreira do conhecimento é estabelecida pela vaidade pessoal dos professores e pelo tendenciosismo dos recursos financeiros, a pós-graduação paga, na medida em que fará ampliar o sentido mercadológico do ensino superior, só irá agravar a situação, tornando as universidades ainda mais elitistas e burocratizadas.

FONTES: G1, Rede Brasil Atual, Blogue Cinema e Outras Artes.

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